SOU FELIZ PORQUE FAÇO PARTE DA FAMÍLIA DE DEUS


Quando criança, eu e meu irmão tínhamos uma tarefa bem cedo todos os dias, buscar leite para nossos irmãos menores, na época fazia-se “contrato de leite”, o lugar era longe, aconteceu algumas vezes de deixarmos a garrafa cair e tudo estava perdido, então começava o choro, não pelo leite derramado, mas por causa do “coro” que íamos tomar ao chegar em casa sem leite. Algumas vezes fugíamos para os cafezais e só retornávamos com a promessa de não apanhar.

Como é boa a lembrança do tempo de criança, mesmo em circunstância em que apanhávamos por derramar o leite. Lembro-me o quanto era bom estar com a família reunida no café no almoço e no jantar. Tínhamos outro costume em família que era fazer o culto pela manhã e a noite, os cultos demoravam e dormíamos e nosso pai dava um tapinha na mesa e todos ficávamos atentos.

Como era bom falar com o pai e com mãe pela manhã, acordar do lado dos irmãos, trabalhar juntos, ir para a escola e para igreja. Os anos se passaram, mudamos do estado Espírito Santo para o Estado do Pará.  O trabalho na roça sempre foi motivado pelos ideais do meu pai de se tornar grande produtor de café e de ter uma boa criação de gado.

Não tinha muitos sonhos, antes de me tornar evangélico desejava ser padre. Na região em morávamos raramente ia padre a igreja em que pertencíamos. Das vezes que ia igreja ele se hospedava em nossa casa, eu e meus irmãos achávamos maior barato, pois as hostes que sobravam da reza ele nos dava para comer.

Bem, muitas das coisas que fizemos não passaram de utopia, não tivemos bons resultados com o café, e o gado só dava para suprir nossas necessidades. Decidi dar outro ruma a minha vida, fui tentar a “sorte” em Belo Horizonte, mas não agüentei muito tempo.  Longe da família, sem referêncial, sem formação, perdido como filho pródigo, vivi longe de casa, andei de cabeça baixa por muito tempo envergonhado das coisas erradas que fiz, depois de sofrer bastante resolvi retornar para minha família.

Arrependido retornei para casa e também para a igreja, tempos depois liderei a juventude da igreja e passei a ensinar na EBD, envolvi na obra de Deus, pregando na igreja, abrindo frentes missionárias. Começamos um trabalho evangelístico na casa do meu pai, nos reunimos debaixo de uma árvore no terreiro da nossa casa, residência simples, feita de lasca de açaí e barro cru. A cobertura do nosso local de reuniões era as folhas das árvores, os bancos eram de pau roliço e tabuas tiradas de motosserras.

Confesso que foi a melhor igreja que frenquentei em toda minha vida, no terreiro da minha casa, junto com todos meus familiares eu e o pai intercalávamos as pregações sendo uma vez dele e outra minha. Muitos de nossos vizinhos se converteram e continuam sendo benção na obra de Deus.

O sonho do meu pai era ter um local mais confortável para nossas reuniões semanais, as quartas-feiras e aos domingos à tarde, para dar uma melhor referencia batista naquele local, mas não tínhamos condições e nem a igreja também poderia construir.

Como estava envolvido no trabalho evangelístico a igreja me fez um desafio de assumir a igreja Batista Betel, na vila Caracol na Rodovia Santarém-Cuibá, pois havia muito tempo que a igreja estava sem obreiro. Foi um desafio e tanto, porém não fui sozinho. Na época o pastor Elderson Mezzomo tinha terminado o primeiro ano do seminário, trancou o curso por um ano para ajudar aquela igreja.

Prestes a completar um ano que estava sem ver minha família meu pai sofreu um acidente de moto e tudo que eu queria era estar perto dele. Não demorou muito, pouco dias que retornei para casa, meu pai faleceu. Não voltei mais para igreja, a dor era indescritível, decidi ficar com minha família.

A lembrança que tenho mais forte de meu pai é do dia em fui pedir a ele para sair de casa novamente, mas dessa vez para a obra do Senhor. Ele estava serrando uma madeira, todo suado, cheio de pó, largou imediatamente o motosserra encheu o peito e expressou toda a sua felicidade por causa daquela notícia.

Como filho mais velho assumi as responsabilidades de casa, valeu os ensinos do meu pai, a persistência dele em pregar o evangelho para mim, eu fui o último a aceitar Jesus. Dois anos depois da sua morte eu casei e disse a minha esposa que um dia iria para o seminário me preparar melhor para ministério.

Eu tinha certeza que Deus me queria na obra, mas não tinha coragem de assumir essa responsabilidade, certo dia eu tive a oportunidade de ouvir o pastor Waldomiro Tymchak pregar, e na hora do apelo missionário eu fui chorando à frente dizendo que estava disposto a ser usado pelo Senhor. Terminei o ensino médio e vim para o seminário.

Muitas coisas mudaram em minha vida, eu aprendi a viver na dependência de Deus. Vim para o seminário sem conhecer ninguém, sem dinheiro, mas confiante que Deus ia suprir minhas necessidades e de fato supriu. Deus usou muita gente para nos abençoar, os da igreja que nos enviou os de outras igrejas que só vieram a nos conhecer só dois anos depois, e outros que não tem nenhuma relação com nossas igrejas batistas, mas tem compromisso com o Reino de Deus.

Sinto muita saudade de minha família, dos amigos que deixei em minha cidade, em compensação fizemos vários outros amigos que tem sido pai, mãe e irmão. Meu pai não me viu pastor, mas teve a alegria de me ver envolvido na obra do Senhor. Aconteceram coisas em minha vida que jamais imaginaria que iria acontecer.

Minha preocupação maior em vim para o seminário era em relação a minha esposa e filhas, como vou sustentá-las, vestí-las, porém o senhor me respondeu em Mateus 6.24-34. Confiei no Senhor e nunca passei uma necessidade sequer.

Estou concluindo o seminário, pastoreio uma congregação dois meses depois que cheguei em Belém desde 03 de março de 2007. Em novembro de 2009 passei a ser bolsista da Junta de Missões Nacionais, e ao terminar o curso de teologia estarei no quadro de missionários da JMN.

No meu ultimo ano do seminário só tenho que preocupar com minha família, mensalidade e aluguel a JMN paga. Sou feliz, mesmo vivendo longe de meus irmãos e minha mãe, sinto saudade da igreja que me enviou ao seminário, graças a Deus conquistei outras amizades, pessoas que nos amam de todo coração, mesmo sem conhecer nossas origens e sem nenhuma relação familiar. Sou feliz porque faço parte da família de Deus. Por isso não choro o leite derramado.

ANDERSON RESENDE BARBOSA

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